terça-feira , 19 de março de 2024
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Editores científicos e as métricas alternativas

Por Andréa Gonçalves do Nascimento. É Mestre em Biblioteconomia pela UNIRIO e autora do “Guia prático de altmetria para bibliotecários” (em produção). Email: aandreafg@gmail.com

 

A essa altura, é bem provável que a maioria dos editores de periódicos científicos no Brasil já tenha ouvido falar em altmetrics – em português, altmetria, ou métricas alternativas – porém é possível que muitos ainda não saibam ao certo o que isso significa e qual o impacto que pode ter sobre o seu trabalho.

Nesse blog, já foram publicados posts recentes de Átila Iamarino e Solange Santana apontando a importância das redes sociais e das métricas alternativas para os periódicos científicos, e agora retomo o tema para falar sobre os benefícios e alguns desafios que os editores enfrentam para adotar o uso dessas ferramentas.

A altmetria representa uma nova maneira de medir o alcance e a influência de trabalhos acadêmicos, a partir da sua repercussão on-line e em plataformas de mídia social. Em lugar de medir o impacto de um trabalho considerando somente as citações recebidas em outros trabalhos publicados, a altmetria se propõe a fornecer uma visão mais abrangente sobre o impacto de um trabalho acadêmico, monitorando atividades antes inexistentes ou ignoradas, tais como interações em redes sociais, menções em jornais, revistas e blogs, ou o uso de resultados de pesquisa em políticas públicas, para citar alguns exemplos.

A altmetria também permite monitorar diversos outros tipos de produção além do artigo acadêmico, tais como conjuntos de dados, literatura cinzenta, relatórios, vídeos, postagens em blogs e outros conteúdos de valor potencial.

Essas novas métricas podem – e devem – ser usadas juntamente com indicadores tradicionais de impacto, como as contagens de citações e a revisão por pares, a fim de compreender a influência do artigo levando em conta os vários aspectos onde esse trabalho demonstra ter impacto.

imagemFonte: adaptado de altmetric.org

A maioria dos autores deseja saber como seu trabalho é recebido pelos pares, e o mesmo ocorre com os editores de periódicos científicos. Um dos benefícios da altmetria é permitir que os autores vejam onde e por quem a sua pesquisa está sendo discutida e compartilhada, abrindo uma possibilidade de comunicação entre pesquisadores, ou ainda revelando possíveis desdobramentos do trabalho de que o autor sequer tinha conhecimento. Ou ainda, ele pode descobrir que sua pesquisa não está sendo vista ou comentada, o que pelo menos lhe fornece indícios de que ela precisa ser melhor divulgada.

Toda essa dinâmica também é útil para os editores científicos, que podem usar as métricas alternativas não somente para acompanhar a repercussão online dos trabalhos, mas também para entender melhor sua audiência e interagir nas discussões sobre o artigo em blogs e sites de mídias sociais, aumentando ainda mais a visibilidade do artigo e do periódico. Outro benefício da altmetria para os editores científicos é poder usá-la para detectar temas quentes na sua área, bem como identificar e monitorar trabalhos com alto potencial de citação futura com base na repercussão online imediata [1].

Cabe destacar que o aumento da visibilidade e da circulação de um artigo depende em grande parte do papel ativo dos autores e editores em promover esse conteúdo. Nos Estados Unidos e Europa, a importância das mídias sociais na difusão de trabalhos acadêmicos é reconhecida por muitos autores, e os periódicos de grande porte, como Nature, Science, PLOS, e editoras internacionais, como Elsevier e Springer, há muito tempo adotaram estratégias de mídia social para a divulgação de seus conteúdos, que potencializam o alcance já amplo dos artigos publicados nessas revistas. As principais editoras acadêmicas internacionais – Elsevier, BioMed Central, Nature, Springer, Emerald, Wiley, High Wire Press, Ingenta, Taylor & Francis – também firmaram parcerias com os provedores de ferramentas de altmetria e incluem métricas alternativas em seus artigos online.

Fora do mainstream, os periódicos que mais podem se beneficiar da altmetria são: (a) aqueles focados em nichos muito específicos, para os quais é importante conhecer bem quem são seus leitores e possíveis colaboradores, (b) periódicos que não estão cobertos no JCR, e por isso não possuem cálculo de fator de impacto, e (c) aqueles destinados a um público mais amplo que o acadêmico, como os periódicos com viés de divulgação científica. Para esses tipos de periódicos, que costumam ter mais dificuldades para justificar sua relevância e a necessidade de recursos para se manter, a altmetria pode ajudar a revelar novas dimensões de uso e influência, apontar tendências a serem examinadas pelos editores, e angariar novos autores atraídos por indicadores positivos.

No Brasil, os editores científicos ainda têm um caminho a percorrer para usar efetivamente as mídias sociais e a altmetria para ajudá-los a melhorar o desempenho e o alcance de suas publicações internacionalmente e, para isso, devem investir em mudanças que os permitam superar e vencer os desafios para implementar essas ferramentas com sucesso.

Sabemos que a maioria dos periódicos brasileiros enfrenta a falta de recursos para criar e implementar uma estratégia de marketing online, mas a experiência mostra que vale a pena investir no uso de redes sociais para aumentar a visibilidade do periódico, assim como de ferramentas de medição e análise para entender melhor quem é o público que efetivamente acessa seus artigos. Periódicos que seguiram esse caminho destacam, dentre os principais impactos percebidos, uma resposta imediata na quantidade de acessos, diversificação do público da revista, aumento da visibilidade da publicação dentro e fora da instituição de origem, crescimento do número de acessos ao site da revista, sobretudo aos artigos que recebem destaque na divulgação, aumento no número de submissões e na variedade institucional dos autores que submetem trabalhos à revista, além de uma maior preocupação em dialogar com seu público e acompanhar as métricas alternativas [2, 3].

Existem diversas soluções tecnológicas e múltiplas ferramentas disponíveis para que os editores científicos adotem o uso de mídias sociais (além do Twitter e Facebook, considere também a divulgação no LinkedIn e em redes sociais acadêmicas, como Academia.edu e Mendeley) e métricas alternativas (como Altmetric for Publishers e a PLOS ALM, cujo plugin pode ser instalado na plataforma SEER).

Independente da solução escolhida, chamo a atenção para algumas medidas que certamente colaboram muito para garantir o sucesso dessa empreitada.

  • Construir uma presença nas redes sociais, através de perfis oficiais com atualização constante, ajuda a aumentar a visibilidade dos artigos e a oportunidade de que sejam lidos, compartilhados e comentados online.
  • Investigar e entender quais são as plataformas online mais usadas pelos leitores de seu periódico, o tipo de interações predominante entre esse público (visualizações, downloads, compartilhamentos, comentários), e o tipo de conteúdo que recebe mais atenção pode ajudar os editores a planejar melhor a divulgação online dos artigos publicados.
  • Usar um identificador digital único para os artigos, como o DOI, que é usado pelas ferramentas de altmetria para rastrear e medir de forma inequívoca as citações online.
  • Incentivar os autores a usar e manter atualizado seu registro de autor no ORCID com links para a produção publicada nas revistas brasileiras.

Lembre-se que as métricas alternativas complementam (e não substituem) os indicadores tradicionais baseados em citações, que vão continuar sendo amplamente aceitos e reconhecidos pela comunidade acadêmica. Sempre que possível, o ideal é utilizar uma combinação de diferentes métricas para dar uma visão mais completa sobre o impacto e a influência do artigo.

A altmetria é uma área relativamente nova, porém é uma tendência que não pode ser ignorada e que já está sendo explorada pelos editores científicos de outros países para medir e comparar a influência de suas publicações. A internacionalização de nossos periódicos certamente passa pela adoção dos mesmos padrões e tecnologias usados por esses países.

Referências:

[1] BRODY, T.; HARNAD, S.; CARR, L. Earlier web usage statistics as predictors of later citation impact. Journal of the American Society for Information Science and Technology, v. 57, n. 8, p. 1060–1072, 2006.

[2] BENCHIMOL, J. L.; CERQUEIRA, R. C.; PAPI, C. Desafios aos editores da área de humanidades no periodismo científico e nas redes sociais: reflexões e experiências. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 40, n. 2, p. 347-364, abr./jun. 2014.

[3] MEDEIROS, C. F.; BARATA, G. Em busca de maior visibilidade, periódicos brasileiros investem nas redes sociais. In: Workshop de Editoração Científica, 8, 2014, Campos do Jordão. Anais… Campos do Jordão: Associação Brasileira de Editores Científicos, 2014. Disponível em: <http://ocs.abecbrasil.org.br/index.php/WEC/viiiwec/paper/viewFile/79/81>.

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