Com a inestimável importância da obtenção de um DOI para o sucesso de um artigo científico e a crescente necessidade da utilização da Crossref para que esses mesmos trabalhos consigam ser localizados e referenciados da maneira exata, usar os dois serviços de maneira combinada vem se tornando um diferencial necessário para a boa divulgação dos estudos acadêmicos.
“Desta maneira, a Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC) se tornou a agência nacional a qual os pesquisadores podem recorrer para a obtenção do DOI via Crossref. Tudo em prol da melhoria na área científica. Estamos trabalhando ativamente para facilitar aos editores brasileiros, muitas as oportunidades que teriam apenas com grandes publishers”, destaca Rui Seabra, Presidente da ABEC.
Para falar sobre o assunto, foram ouvidos dois especialistas de diferentes vertentes da área científica. São eles o Prof. Dr. Gildenir Carolino Santos, do Portal de Periódicos da Unicamp, e a Prof. MSc. Suely de Brito Clemente Soares, consultora OJS da Content Mind.
Veja, abaixo, a opinião dos entrevistados sobre o tema:
Qual a importância de ter seu trabalho citado como referência em outros trabalhos?
Gildenir Santos: A importância é que quanto mais citado o trabalho, mais visibilidade e impacto terá no assunto em que ele está configurado para ser citado. Classifica-se como um trabalho importante a ser citado em outros pelo conhecimento do autor no assunto.
Suelybcs: A citação de um trabalho, de qualquer área do conhecimento, valida sua importância para a produção de uma nova pesquisa, novo texto, de um novo trabalho – significa que de alguma forma impactou uma nova pesquisa, servindo de referencial teórico positivo. Ou seja, em que os resultados são concordantes, ou negativo quando discordantes – um autor poderá ser citado por outro que concorde ou discorde de sua pesquisa. E em ambos os casos as citações são válidas e contam como impacto. Ser citado é ter impacto e os principais índices baseiam-se em citações.
Qual a importância da obtenção de um DOI para uma publicação?
Gildenir Santos: Da mesma forma da importância de citar o trabalho para reconhecimento, com a atribuição do DOI o trabalho também ganha visibilidade internacional. Há também a persistência do link de não ser removido de hipótese alguma, mesmo se for removido de determinado servidor. O link mantém-se persistente e não há quebra dele na recuperação da publicação na Internet.
Suelybcs: Antes de existir DOI, os trabalhos científicos se perdiam na internet porque as URL’s dos artigos mudam sistematicamente. É por isso que as normas de referências, sem exceção, incluem a informação “Disponível em:”, “Acesso em:”. Ou seja, naquele dia, a URL daquele trabalho citado era de fato aquela.
Quando as editoras se fundem, os bancos de dados alteram na plataforma. Quando há qualquer mudança de servidor de arquivos, as URL’s dos artigos mudam, e os arquivos dos textos completos se perdem na imensidão da internet. O DOI foi criado justamente para ser um identificador persistente. Ou seja, em outras palavras, uma URL que nunca muda sempre dará acesso ao texto completo, ainda que a URL do arquivo original seja alterada. O editor é o responsável pela atualização constante da URL do DOI para a URL ativa, para que sempre dê acesso ao texto completo imediatamente.
Existe a possibilidade de existirem DOI’s duplicados? Se sim, qual o impacto disso para um artigo?
Gildenir Santos: Pelo que sei, não há possibilidade de duplicação de DOI. Ele é único, como se fosse o “RG” da publicação. A publicação que recebe DOI é unicamente exclusiva com aquele DOI que lhe foi atribuído.
Suelybcs: Cada documento digital deve ter um único identificador digital, ou seja, um único DOI. Quando a Crossref identifica qualquer erro, notifica o editor para que ele faça a correção. Quando o editor vai fazer o upload de seus arquivos, a Crossref identifica duplicação e acusa o erro. No entanto, a responsabilidade de manter um único DOI para um determinado arquivo digital é do editor.
Há outras agências fornecedoras de identificadores digitais que fazem um serviço similar e que tem outro nome. Por exemplo, o Handle, fornecido aos documentos digitais publicados nos repositórios em DSpace, entre outros. Mas existe a possibilidade, dada pela própria Crossref, de um mesmo arquivo ter um DOI principal e um DOI secundário, que é redirecionado ao principal, dentro da própria Crossref.
Isso ocorre quando uma revista que é Scielo, por exemplo, tem DOI via Scielo e também tem o mesmo artigo no portal de periódicos, em OJS, na sua própria instituição. Neste caso, o DOI principal deverá ser configurado pelo editor, indicando qual deles será o secundário.
Atualmente, a Scielo está aceitando publicar artigos com os DOI’s das instituições e não da Scielo, o que não era possível até pouco tempo atrás.
O impacto de DOI’s duplicados para um mesmo artigo é particionar as citações, pois elas serão subdivididas em DOI’s diferentes, diminuindo o impacto da revista e até mesmo os indicadores de autoria, como o índice H do autor, por exemplo.
Qual a importância da Crossref para a comunidade acadêmica?
Gildenir Santos: A Crossref, como agência oficial do DOI, que teve seu início em 2000, tornou-se fundamental para a comunidade científica internacional a partir do momento que foi criada. Ela teve como objetivo ajudar na visibilidade e sustentação da publicação na Internet por mantê-la persistente na pesquisa sem problemas de localização, pois o link persistente a mantinha disponível na rede. As grandes editoras e sociedades comerciais brindaram em relação a isso, e principalmente quem foi beneficiada foi a comunidade acadêmica.
Suelybcs: A Crossref presta um serviço importantíssimo para a comunidade acadêmica, registrando um identificador digital, um URL RESOLVER para cada documento digital. Desta forma o documento digital é individualizado, ou seja, as citações feitas a ele são inequívocas. Ao citar um determinado DOI, o autor está dizendo à comunidade acadêmica que o trabalho que utilizou como seu referencial teórico é, inequivocamente, aquele mesmo, e não qualquer outro semelhante.
Assim como o ORCID, que individualiza o autor, o DOI individualiza o documento digital, esteja ele em qualquer formato, em texto, imagem, som e/ou vídeo. O “Disponível em:”, “Acesso em:” não resolvia o problema porque não garantia acesso ao texto completo citado. O DOI garante acesso ao texto completo, exatamente ao texto citado.
Por que utilizar a Crossref e não o WoS ou o Scopus?
Gildenir Santos: Em relação a essa pergunta tem que ficar esclarecido que a Crossref não é uma base de dados, enquanto que a Wos e Scopus são. Tanto a WoS quanto a Scopus utilizam em suas bases o DOI, advindo da Crossref, que o fornece. A utilização da Crossref está independente ligada ao fato de utilizar o Wos ou Scopus. Além de tudo, todos são recursos de pesquisa, fontes eletrônicas de pesquisa.
Esse contexto pode ser diferenciado pelo fato de que na maioria das vezes o que não está indexado na WoS ou Scopus possa estar incluso no catálogo da Crossref, pois a publicação utiliza o DOI. Para estar incorporado a WoS e Scopus é preciso passar por critérios e requisitos de indexação e ser aprovado para fazer parte dessas bases. Enquanto na Crossref, fazendo-se um contrato de convênio para aquisição do DOI, você ingressa muito mais rapidamente, e tem a visibilidade reconhecida de sua publicação.
Suelybcs: São serviços totalmente distintos. O DOI da Crossref tem o objetivo de dar acesso imediato ao texto completo – ele não começou com a ideia de ser uma base de dados indexadora.
WOS e Scopus são bases de dados indexadoras desde sempre. Fornecem diversos serviços agregados aos seus usuários. Ambas têm esta finalidade: indexar revistas que passaram pelos critérios previamente estabelecidos por cada uma delas.
No entanto, pelo volume absurdamente grande acumulado de artigos ou de documentos digitais, a Crossref hoje tem condições de desempenhar também o papel de base de dados de citações, pois tem um volume de dados que excede em tamanho qualquer outra.
Quais novidades o Crossref propicia a quem o utiliza?
Gildenir Santos: Você ganha visibilidade da publicação no meio internacional; persistência do link do DOI; benefícios na utilização de outros produtos por fazer parte da Crossref etc.
Suelybcs: As novidades foram divulgadas, em 17 de janeiro de 2018, no artigo Crossref como uma nova fonte de dados de citações: uma comparação com a Web of Science e Scopus. Nesta reportagem, a Crossref se coloca como uma nova fonte de citações, baseando-se no fato de que tem um volume de dados, especialmente abertos, que excede as 2 principais bases de dados multidisciplinares que são de acesso restrito. Justifica-se pela importância, que de fato tem para os cientométricos, pesquisadores que estão trabalhando com as medidas da publicação cientifica. Os cientométricos precisam de identificadores digitais para que suas análises sejam inequívocas e confiáveis. De identificadores como DOI, que identificam os documentos digitais, e como ORCID, que identificam e personalizam os autores.
E a Crossref se coloca como a principal fonte para de identificadores digitais dos documentos, possibilitando o rastreamento automático de todas as citações que forem feitas por outros documentos que também possuam DOI. Pois lá estão, citante e citado, na mesma base de dados, na Crossref Metadata. Desta forma, a Crossref se apresenta, na reportagem, como a melhor e a maior fonte de informação para que um autor saiba onde e por quem foi citado.
Você acha que seria uma opção viável unificar os artigos em apenas um local, como o Crossref, por exemplo? Por quê?
Gildenir Santos: Atualmente, as instituições brasileiras, no caso das universidades, estão adotando a prática de criar seus Portais de Periódicos. E isso facilita quando você se associa à Crossref, pois terá um prefixo único para sua instituição e a recuperação dos artigos fica muito mais fácil, pois está sendo gerenciado por um sistema em um único local, como o Portal que terá indexado todos os artigos das publicações que fazem parte desses Portais.
Agora, se possuir um único local, como o que está sendo criado com a participação de grandes editoras e até mesmo com a participação em massa da Crossref do projeto I4OC (Iniciativa para Citações Abertas), isso facilitará muito a visibilidade e recuperação de informações, como as citações gerenciadas pela Crossref que utilizam o DOI.
Suelybcs: Não, sem monopólios! Nenhum local, ainda que seja o que tenha o maior volume de dados, deverá ser a única fonte de informação para a comunidade acadêmica. As áreas do conhecimento têm suas especificidades e ainda não há sistema informático que dê conta de atender a todas as necessidades de toda a comunidade acadêmica.
Ou seja, ainda que a Crossref detenha, hoje, um volume maior de dados, não consegue fornecer, nem de longe, todos os serviços agregados que a WOS e/ou Scopus e/ou qualquer outra base de dados multidisciplinar tenha. E quando se trata de uma área específica do conhecimento, Crossref atende menos ainda.
Voltando a uma pergunta anterior, a Crossref tem como objetivo primeiro dar acesso ao texto completo. Para isso, constrói uma base de dados chamada Crossref Metadata. Outras bases de dados, multidisciplinares ou de determinada área do conhecimento, oferecem “n” outros serviços agregados, e não apenas dar acesso ao texto completo do documento digital – ao que se propõe a Crossref.
Você acha que os artigos devem ser publicados com acesso aberto? Por quê?
Gildenir Santos: Sim. Acredito que o Movimento do Acesso Aberto, criado desde 2002 por pesquisadores e instituições que almejavam o desejo de disponibilizar informações de suas publicações, por muitas vezes estavam enclausurados pelo sistema pago das grandes editoras acadêmicas, tenham impulsionado para que esse paradigma fosse rompido. Isso deve atuar para o bem e conquista das pesquisas que o acesso aos artigos produzidos fosse de acesso aberto e que chegasse de maneira fácil e rápida aos pesquisadores, sem a problemática de obter lucros com o que pode ser de acesso aberto. Essa mentalidade de publicações fechadas está caindo por terra, e cada vez mais, está se evidenciando o discurso mais prático, ou seja, disponibilizar a publicação, publicar para o acesso aberto.
A Pesquisa Fapesp n.263 de janeiro 2018, de acordo com o relatório internacional Science-Metrix, aponta que 75% dos artigos em periódicos brasileiros estão disponíveis gratuitamente, sem cobrar nada dos leitores, em grande parte graças à bases de dados SciELO. Com essa reportagem, comprova-se que é necessário o acesso aberto, e para o avanço às pesquisas e à Ciência.
Suelybcs: Sim! Ainda que tenha sido publicado em uma base de dados de acesso restrito, um artigo deverá também ser publicado em outra plataforma de acesso aberto, para que alcance um número maior de citações em menos tempo. Cito como exemplo os repositórios institucionais, temáticos e/ou de dados.
Atualmente, o impacto dos preprints, por exemplo, está chegando com força nas publicações periódicas científicas, especialmente pela visibilidade imediata que dá aos resultados de uma pesquisa, antecipando citações até mesmo antes de ser publicado o artigo final em uma determinada revista e indexado em determinada base de dados.
Tadeu Nunes (4toques comunicação)
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