Por Germana Barata
A BlackFriday tem se tornado uma data de grandes expectativas para o consumidor também no Brasil. Este ano não passou incólume nem para o mercado editorial científico brasileiro! A cultura de liquidações agora encontra espaço nas revistas científicas predatórias que prometem descontões e pacotes com 2 e 3 artigos!
As chamadas revistas predatórias são aquelas de qualidade editorial duvidosa, mas que garantem, mediante o pagamento de taxas APC, a publicação rápida do seu artigo, muitas vezes sem qualquer recomendação de pareceristas ou pedidos de ajustes. Pagou, publicou! De acordo com alguns destes anúncios, cobra-se US$45 para “ajuda em custos diagramação, formatação e manutenção da publicação”, mas pode variar de R$160 a R$800, nos casos que tivemos acesso.
As estratégias de atração de autores passa por convites via email com elogios a trabalhos seus apresentados em congressos, dissertação, tese, entre outros. Os emails contém seu nome, título do seu trabalho, dando a impressão que se trata de um convite genuíno. Um email enfatiza a qualidade de meu artigo, já publicado na TransInformação: “Observando a relevância e contribuição que este artigo tem na área de estudo abordada, depois de analisado por nosso comitê editorial, convido você a publicá-lo na revista”,
As revistas, muitas com títulos em inglês, que mimetizam revistas internacionais de credibilidade, já causam problemas éticos quando convidam para republicar artigos ou materiais já publicados, portanto não mais inéditos. “Não precisa de atualizações e alterações neste momento”, afirma um dos convites que recebi.
Os títulos das revistas são geralmente bem genéricos, dando a impressão de interdisciplinaridade: incluem palavras chave como: revista de desenvolvimento tecnológico, ciência e tecnologia, inovação, revisão em pesquisa. Muitas incluem como indexadores apenas buscadores, como o Google, bancos de dados ou o próprio site do DOI (Digital ObjectIdentifier, número que identifica um documento digital) ou ISBN (registro de livros).
ABEC Brasil lança GT
A ABEC gostaria de alertar a comunidade acadêmica sobre as revistas Predatórias, que em troca de pagamentos de taxas, muitas vezes atraentes, acabam publicando seu trabalho sem critérios e prejudicando sua credibilidade e disponibilizando ciência de baixa qualidade.
Pensando em alertar e conscientizar a comunidade acadêmica e editorial, a Abec iniciará um Grupo de Trabalho Revistas Predatórias, coordenado pela professora associada da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), médica da Escola Paulista de Medicina (EPM-Unifesp) e segunda tesoureira da Abec Edna Montero, para identificar as revistas brasileiras ou associadas da ABEC ou COPE (Committee on Publication Ethics).
“O GT tem por objetivo identificar as revistas brasileiras que apresentem características de publicações predatórias com um olhar sobre os princípios da transparência. A partir deste passo inicial, prosseguiremos para uma abordagem mais detalhada em conformidade com os bons princípios da publicação científica”, afirma.
Ronaldo Araújo, professor e cientista da Informação da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) irá compor o GT. Recentemente, Ronaldo alertou a comunidade acadêmica em sua conta do Twitter sobre os inúmeros convites que chegam por email de editoras predatórias. “Não caiam nessa!”, disparou em um bem-humorado alerta sobre a importância da comunidade estar de olhos bem abertos para enxergar o que está por trás dos sedutores convites.
O problema das revistas predatórias não é novo, mas parece que com a facilidade das redes sociais, as exigências por produtividade e, mais recentemente, a queda de produtividade que a pandemia impôs a muitos acadêmicos, podem ser novos fatores de impulsionamento destes anúncios. Segundo AnnaSeverin e Nicola Low, da Universidade de Berna, na Suíça, em editorial em acesso aberto para a International Journal of Public Health (2019), as revistas predatórias já estão infiltradas em bases de credibilidade como a PubMed e a Scopus. Os autores enfatizam que listas são difíceis de se manter atualizadas, que idealmente é preciso capacitar editores e a comunidade a identificar publicações potencialmente predatórias.
Sigmar Rode, presidente da ABEC Brasil, lembra que a decisão de escolha de revistas e editoras onde deve publicar seus resultados de pesquisa fica a cargo dos autores, mas lembra que esta escolha precisa ser consciente: “É óbvio que o autor publica onde quiser, mas tem que estar atento sobre o que é e quais são as revistas predatórias. O importante é que agências de fomento e instituições de ensino e de pesquisa não considerem e não computem esses trabalhos na produção do autor”, defende.
Ainda não existe uma lista oficial no Brasil que inclua revistas possivelmente predatórias, mas a Abec espera apoiar a comunidade em direção à conscientização, a capacitação e ao debate para barrarmos a atuação de editoras e revistas que ameaçam a integridade e a qualidade da ciência. Além do GT Revistas Predatórias, a Abec está organizando um webinar sobre o tema. Fique atento e participe deste debate.
Até lá, considere algumas dicas sobre o que fazer quando receber um convite para publicação:
- Certifique-se que o artigo não será republicado;
- Verifique se a revista está indexada (não considere Google, DOI, ISBN, Amazon como indexadores);
- Verifique as áreas de especialidade da revista e desconfie quando abrange de educação, à matemática, geografia e neurociência.
- Verifique a equipe editorial e instituições envolvidas;
- Verifique se colegas e colaboradores conhecem e recomendam a publicaçãO
Germana Barata é 1a secretária da ABEC Brasil e pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
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